O presidente da Associação de Parentes de Vítimas brasileiras do AF 447, Nelson Marinho, afirma que o BEA (Escritório de Investigações e Análises, órgão encarregado das investigações do acidente na França) concluiu que os pilotos do Airbus da Air France, que caiu no Oceano Atlântico em junho de 2009 deixando 228 mortos, “não estavam aptos para entender e responder ao problema” durante o voo.
Os familiares tiveram uma reunião de quatro horas nesta quinta-feira (5) com o diretor do BEA, Jean-Paul Troadec, em Paris. Na ocasião, os investigadores que investigaram a tragédia apresentaram as conclusões do relatório final. O documento será divulgado à imprensa ainda nesta quinta-feira.
“Para mim, não mudou nada. O BEA apresentou um conjunto de informações técnicas, a maioria dos familiares não entende isso. Eles continuam com a principal acusação de que os pilotos erraram, mas sabemos que eles não tiveram culpa. O excesso de automação, apontado também pelo BEA, fez os pilotos ficarem reféns da máquina”, afirmou Marinho ao G1.
“Os pilotos não tinham sido treinados e não estavam aptos para responder àquela situação do avião. Há um excesso de automatismo. Isso eles falaram”, acrescenta Marinho.
“Eles citaram que recomendaram às empresas, tanto a Airbus quanto a Air France, para corrigir o treinamento dos pilotos. Mas há uma contradição: como botam pilotos para voar nestas condições? Eles eram comandantes com grandes experiências na área”, diz Marinho.
Maarten Van Sylus, representante das famílias alemãs e que também participou da apresentação, afirmou ao G1 que "as 10 recomendações de segurança dadas pelo BEA são, para os familiares, uma pequena, mas notável conquista". "Isso tira das costas dos pilotos o jugo da responsabilidade total pela tragédia". Segundo ele, algumas recomendações são técnicas e, outras, relativas a treinamento e procedimentos de voo e servirão como base para procedimentos jurídicos dos familiares contra a Air France e a Airbus.
No início de junho, o G1 adiantou que o relatório final concluiu que os pilotos do AF 447 não compreenderam a tempo que o avião perdeu a sustentação (entrou em situação de estol) após um procedimento equivocado do copiloto mais novo, e isso levou à queda do avião.
O acidente ocorreu após o Airbus deixar de enviar informações confiáveis aos pilotos sobre velocidade após o congelamento do sensor pitot ao passar por uma tempestade, desconectando o piloto automático. O copiloto mais novo tomou uma atitude errada, de elevar o bico da aeronave, provocando a perda de sustentação da aeronave. O copiloto mais experiente e o comandante não perceberam o erro e não identificaram que o avião caía.
'Defeito de fabricação'
Para o representante das famílias brasileiras na tragédia, o Airbus tem um “defeito de fabricação”.
“Vemos o BEA fugindo da verdadeira causa do acidente. O automatismo foi a principal causa”, diz.
Marinho diz que questionou Troadec sobre o motivo de os pilotos do AF 447 não terem desviado da tempestade, que congelou os sensores de velocidade pitot. “Naquela noite, o único voo que foi em frente na direção das nuvens foi o AF 447. Eles não souberam explicar o motivo”, lembrou.
Falha em treinamento
Para Maarten Van Sylus, “os pilotos não tinham meios suficientes para depreender a situação em que se encontravam. Não existia treinamento para aquela situação”.
“Os incidentes e acidentes que ocorreram antes do AF 447 (em que houve congelamento de pitots e problemas de falta de informações em alta altitude) não foram suficientemente estudados a fim de evitar uma complicaãoo mais grave, que acabou por derrubar o Airbus”, disse.
Maarten diz que “o relatório final descreve todos os diálogos e parâmetros de voo. O ponto crucial foi a perda das leituras de velocidades".
"Não há indicações de responsabilidades (no relatório final). Mas, com o fechamento dos trabalhos do BEA, temos fundamentação suficiente para uma ação imediata contra a Air France no Brasil. Houve exposição excessiva a riscos, em especial devido à errônea avaliação dos alertas anteriores sobre pitots defeituosos e não inclusão de treinamento aos pilotos para como responder a estas situações", diz Maarten.
A investigação do BEA confrontou dados das caixas-pretas com ações da cabine e respostas da aeronave e apontará, conforme apuração do G1, que o desenho da cabine, o automatismo do Airbus e a falta de treinamento adequado estão entre os principais condicionantes para que os pilotos não tenham entendido por que o avião estava caindo.